quarta-feira, 26 de junho de 2013

Pacientes com artrite reumatoide precisam de avaliação oral atenta

 

Uma das articulações mais frequentemente acometidas pela artrite reumatoide é a temporomandibular (ATM), usada para abrir a boca e para mastigar. Apesar disso, são escassos os estudos que avaliam as consequências dessa doença sobre a região orofacial, que engloba boca e face, onde a ATM se situa.

Um grupo de pesquisadores da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp) estudou a força de mordida dos pacientes com artrite reumatoide atendidos pela instituição e constatou que a avaliação da ATM pode contribuir para o diagnóstico da doença, antes que ocorram alterações irreversíveis.


“Constatamos que a região orofacial desses pacientes tem, de fato, mais alterações do que na população saudável, incluindo menor força de mordida. A avaliação da ATM deveria, portanto, constar em consultas padrão, como forma de controlar a inflamação e a doença”, disse Jamil Natour, professor de Reumatologia da Unifesp e coordenador de pesquisa sobre o tema apoiada pela FAPESP.

A artrite reumatoide é uma doença autoimune, causada pela agressão do sistema imunológico ao próprio organismo – neste caso, as articulações sinoviais são os principais alvos. O interior desse tipo de articulação é revestido pela membrana sinovial, que a artrite reumatoide torna espessa e inflamada. A membrana passa, então, a produzir substâncias que comprometem as estruturas articulares, podendo lesionar a cartilagem, o osso, ligamentos e tendões e resultar em deformidades e sequelas.
Na avaliação da ATM, os pesquisadores da Unifesp acompanharam dois grupos: o grupo denominado AR (artrite reumatoide), constituído por 75 pacientes da Unifesp; e o grupo controle, com 75 adultos sem doença aguda nem crônica e sem queixas na região da ATM – voluntários que compareceriam à instituição para fazer exames de rotina, doar sangue ou acompanhar pacientes. “Todos os participantes eram do sexo feminino, mais acometido pela artrite reumatoide e disposto a integrar estudos científicos”, explicou Natour.

A comparação entre os grupos envolveu uma avaliação pela dentista Carmen Paz Santibañez Hoyuela, integrante do grupo de pesquisa e mestranda da Unifesp, que levantou o histórico de cada participante, fez exames físicos, aplicou questionários sobre o desempenho de atividades cotidianas e sobre o desenvolvimento da artrite reumatoide, além de medir a força da mordida e da mão.
Esse último aspecto foi particularmente importante para documentar se as perdas nas duas regiões são simultâneas, o que foi comprovado. “O comprometimento nas mãos é bem conhecido e estudado.
Queríamos checar se pacientes com artrite reumatoide e problemas nas mãos também apresentam problemas na ATM”, disse Natour.

“Verificamos que a menor força de mordida acompanha a diminuição da força nas mãos, mostrando que a região orofacial tem acometimento concomitante a outras partes do aparelho musculoesquelético e deve, portanto, ser acompanhada e avaliada”, afirmou.

As medições foram feitas com dinamômetros, aparelhos usados para estabelecer forças. Para a mordida, os pesquisadores encomendaram à empresa Filizola um gnatodinamômetro (para medir a força empreendida no fechamento da mandíbula), desenvolvido e adaptado para o estudo.
Com o instrumento, foi mensurada a força sobre a área dos dentes molares (de ambos os lados) e dos incisivos. Já para medir a força da mão e a de pinça (entre os dedos polegar e indicador), foram usados dinamômetros já existentes no mercado e aceitos internacionalmente como instrumentos para estabelecer a preensão – dinamômetro Jamar e Pinch gauge, respectivamente.

“Correlacionamos os resultados da avaliação orofacial com parâmetros funcionais, clínicos e de atividade da doença, bem como a força de mordida com a força da mão. Foi assim que concluímos que as mulheres do grupo AR apresentam mais sinais e sintomas na região orofacial e menor força de mordida”, explica Natour.

Contribuições e próximos passos
A artrite reumatoide acomete de 0,5 a 1% da população e em geral surge entre os 30 e 40 anos – embora possa aparecer em qualquer idade. Quanto mais intensa e prolongada a exposição à inflamação articular, maiores as lesões que a doença pode provocar.

É comum que múltiplas articulações sejam comprometidas e não existe cura definitiva. O tratamento envolve medicamentos, injeções nas juntas inflamadas, fisioterapia e eventualmente cirurgias, a fim de conter o processo inflamatório e a progressão das lesões, controlar a dor e as alterações nas funções desempenhadas pelas diferentes regiões do corpo.

O comprometimento ou não da ATM depende de fatores como idade, tempo de doença, número de articulações com edemas, presença de fator reumatoide (anticorpo presente em cerca de 90% dos pacientes com artrite reumatoide) e resultados dos exames proteína C reativa e velocidade de hemossedimentação. Mas Natour lembra que “tais exames são inespecíficos – qualquer doença inflamatória, até uma gripe, pode alterá-los – e o diagnóstico é clínico”.

Comprovada a necessidade de acompanhar as alterações provocadas pela artrite reumatoide na ATM, o passo seguinte é pensar em intervenções que possam melhorar as funções da boca e da face e a qualidade de vida dos pacientes. Nesse sentido, agora já se sabe que a primeira medida deve ser uma atenção mais cuidadosa à avaliação oral de quem tem a doença.

A pesquisa contou ainda com a participação da médica reumatologista Rita Nely Vilar Furtado e da fisioterapeuta e mestranda Aline Chiari, ambas da Unifesp. Concluída em 2012, teve resultados apresentados no mesmo ano no Congresso Europeu de Reumatologia, em Berlim, na Alemanha, e um artigo completo está em fase de aprovação para publicação em revista científica.

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